Toda notícia que se preze deve trazer os dois lados da história. No Ciclo de Palestras sobre Gestão em Comunicação, não é diferente. Depois de tantos assessores, chegou a vez dos jornalistas falarem um pouco sobre o relacionamento entre mídia e assessorias. Esta réplica vocês vão conferir no dia 26/06, quinta-feira próxima, às 20h, na sala C-100 do IACS.
Confira a entrevista especial com os palestrantes, os jornalistas Gustavo de Almeida e Marlos Mendes feitas pelos alunos de Gestão de Comunicação.
Perfil - Gustavo de Almeida
Idade: 40 anos
Time: Flamengo
Formação Acadêmica: Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, Universidade Federal Fluminense – 1993.
Atividade: Editor-substituto e Repórter Especial, editoria de Polícia, do Jornal O DIA, e editor-assistente do “Blog de Segurança” de O Dia Online.
Como jornalista, como você vê o trabalho do Assessor de Comunicação?
GUSTAVO: É importante para os dois lados, mas muitas vezes é confundido com o profissional de Relações Públicas e com o de Publicidade. Os profissionais da área devem atentar para estas contradições.
Toda informação necessita de uma fonte. Para você, qual o papel do Assessor de Comunicação na formação do noticiário?
GUSTAVO: O Assessor de Imprensa é fundamental na área de serviços: é ele quem municia o jornal diário com informações buscadas pelos leitores diariamente, como decisões de Estado, concursos públicos, impostos, multas, mudanças de exigências públicas para diversos itens, etc.
Em que medida o trabalho do Assessor de Comunicação ajuda, ou dificulta, o trabalho do jornalista?
GUSTAVO: Atrapalha quando no papel de RP ele tenta diminuir o impacto negativo de uma notícia, bloqueando o acesso ao cliente. Ajuda quando negocia o OFF com o repórter de forma ética e eficaz.
Na sua opinião, quais são os principais erros dos Assessores de Comunicação na hora de se relacionarem com a imprensa?
GUSTAVO: Horários de telefonemas, excesso de valorização do follow-up (se formos atender a todos que precisam saber se um fax ou e-mail chegou, não trabalharemos), e principalmente as reclamações posteriores. O bom assessor deve ter classe e neutralidade e saber não reclamar à toa, só quando necessário, de uma publicação indesejada.
Quando uma sugestão de pauta é boa ?
GUSTAVO: Quando é de interesse dos leitores específicos do veículo.
E quanto ao release, o que você considera mais certo: o texto que vem "pronto para publicar" ou aquele apanhado de informações, fontes e dados organizados?
GUSTAVO: Não há certo ou errado nesta questão. Mas o texto pronto para publicar é, de certa forma, ofensivo para o jornalista. Não se deve publicar releases.
O que os alunos podem esperar da sua palestra?
GUSTAVO: Vou tentar dar uma visão real do mercado e não ser pessimista demais.
Perfil – Marlos Mendes
Idade: 36 anos
Time: Botafogo
Formação Acadêmica: Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, Universidade Federal Fluminense – 1997.
Atividade: Subeditor e Repórter, editoria de Informática, do Jornal O DIA, e responsável pelo blog “Digitais” de O Dia Online.
Como jornalista, como você vê o trabalho do Assessor de Comunicação?
MARLOS: O trabalho do assessor é fundamental para o fluxo de informação entre agentes sociais e os meios de comunicação, responsáveis por levar a informação à sociedade. As assessorias e RP’s são peças atuantes dessa engrenagem. Elas são responsáveis por buscar formas de passar a mensagem das instituições para a sociedade. Mas o assessor não deve ser apenas quem agenda a entrevista ou faz um release. Ele deve buscar o tempo todo formas de levar a mensagem aos veículos e ao público. Isso é muito mais do que escrever um release, disparar um e-mail e ligar para saber se o jornalista recebeu o texto.
Toda informação necessita de uma fonte. Para você, qual o papel do Assessor de Comunicação na formação do noticiário?
MARLOS: Como o nome sugere, facilitar o acesso do jornalista à informação. E procurar formas de fazer sua marca e sua mensagem ocuparem o noticiário. Não é raro o interesse da assessoria e do veículo serem conflitantes. Assim como o jornalista não pode esperar que o assessor passe informações "negativas", o assessor não pode esperar que o jornalista publique ipsi literis o que ele quer ver publicado. É um jogo de perde e ganha.
Em que medida o trabalho do Assessor de Comunicação ajuda, ou dificulta, o trabalho do jornalista?
MARLOS: Na medida em que há assessor que abre acessos e assessor que apenas bloqueia acessos.
Na sua opinião, quais são os principais erros dos Assessores de Comunicação na hora de se relacionarem com a imprensa?
MARLOS: Minha percepção hoje é que às vezes as assessorias são contratadas para trabalhar como agências de publicidade, buscando mídia espontânea para algo que não é notícia, mais por questões orçamentárias do que estratégicas. Também tenho me deparado com assessores que não sabem o que estão vendendo, logo, não sabem despertar o interesse pela pauta. O assessor tem que ser tão jornalista quanto o sujeito que vai escrever a matéria. Ele tem que saber o que quer ver publicado. Ele é um gerador de fatos, tem que ser pró-ativo e não apenas reativo.
Quando uma sugestão de pauta é boa?
MARLOS: Quando rende notícia, lógico. E quando é bem elaborada de acordo com o veículo e a área para a qual ela será passada. Uma pauta pode ser ótima para um suplemento e não ter espaço na geral. Ou ter espaço em ambos, dependendo do enfoque.
E quanto ao release, o que você considera mais certo: o texto que vem “pronto para publicar” ou aquele apanhado de informações, fontes e dados organizados?
MARLOS: Depende da situação. Às vezes você precisa de uma nota, uma agenda, só pra fechar. Às vezes você precisa de um apanhado mais geral. Às vezes você não precisa de nada, mas o assessor sabe convencer o jornalista de que tem uma história boa, que pode render. Cada caso é um caso.
O que os alunos podem esperar da sua palestra?
MARLOS: Uma conversa descontraída, um papo entre profissionais e estudantes (e também estudantes profissionais, por que não?). Prefiro me colocar à disposição para perguntas, contar casos e conversar. Quem sabe convenço alguns a desistirem dessa idéia insensata de virar jornalista?
terça-feira, 24 de junho de 2008
A Reinvenção da Mídia
Debate – Prosa e Poesia – Jornal O Globo –21/06/2008
Houve um tempo em que a difusão de textos, sons, imagens era atividade exclusiva de grandes empresas capazes de arcar com custos altíssimos de impressão, filmagem, gravação, transporte. Essa época ficou para trás. Nos últimos anos, enquanto os computadores barateavam os processos de produção e edição, os blogs, páginas pessoais e ferramentas de compartilhamento de dados fizeram de qualquer usuário da internet um produtor de conteúdo em potencial. Uma verdadeira quebra de monopólio, que forçou as empresas de mídia a repensarem o relacionamento com seus leitores, espectadores, ouvintes, hoje marcado por uma aproximação crescente. Com os papéis de emissor e receptor mais embolados do que nunca, a imprensa deixou de ser fonte única de notícias e análises sobre os fatos, e viu parte de seus anunciantes migrarem para outros setores. Essas mudanças, que vêm sendo observadas em diversos cantos do mundo, inclusive no Brasil — que comemora este mês os 200 anos de criação da imprensa —, são o assunto de vários livros recentes abordados em entrevistas aqui.
‘Cada vez mais um serviço’. Pesquisador inglês afirma ser esse o caminho de sobrevivência do jornalismo nos tempos da internet
O jornalista inglês Charlie Beckett acha que para adaptar-se às mudanças trazidas pela internet a mídia terá que se aproximar dos leitores e pensar a si mesma cada vez mais como um serviço. Diretor do Polis, o think tank de mídia da London School of Economics, ele acaba de lançar na Inglaterra (Wiley-Blackwell, 216 páginas) um livro sobre o assunto: “SuperMedia: saving journalism so it can save the world”. Em entrevista ao GLOBO, em Londres, ele discute as principais idéias da sua obra.
Fernando Duarte: Qual é a sua análise da crise do jornalismo?
CHARLIE BECKETT: Não é somente uma questão de crise, mas de oportunidade. Com base em 20 anos de experiência profissional e no trabalho acadêmico no Polis, vejo que o jornalismo passou nos últimos anos e passará pelos próximos por mudanças nunca vistas antes. Chegamos a um ponto em que teremos de decidir que tipo de mídia queremos. Vivemos numa época em que a mídia digital chegou para ficar e em que as pessoas estão cada vez mais antenadas em relação aos acontecimentos. Aliada ao desenvolvimento tecnológico, a mídia hoje pode fazer por nós coisas que eram fisicamente impossíveis.
No entanto, diversos veículos de mídia europeus têm realizado estudos falando num futuro pessimista...
BECKETT: Sim, o modelo econômico tradicional está em crise, especialmente nos mercados mais tradicionais. No caso de anunciantes, por exemplo, eles estão deixando veículos tradicionais e não necessariamente surgindo nas versões on-line. Antes, bastava aparecer perto de notícias e torcer para seu produto ser comprado, mas anunciantes agora percebem que podem se conectar mais diretamente com o público, anunciando em ferramentas de busca, por exemplo. Sei que a mídia em lugares como Índia e Brasil ainda segue um modelo mais tradicional, mas na Europa o bolo de receitas publicitárias da mídia tradicional está encolhendo. É uma ameaça ao jornalismo de qualidade.
Em “SuperMedia” você também fala numa certa admissão de derrota por parte da mídia tradicional. Por quê?
BECKETT: Porque a tal guerra entre velha e nova mídia acabou e todo mundo hoje em dia é digital de uma certa maneira. Mesmo que você esteja escrevendo algo tão “antiquado” quanto um livro, você pesquisa on-line e conversa com as pessoas via e-mail. Não é mais uma questão de escolha também em relação ao tal jornalismo do cidadão, embora o conceito para mim seja muito mais amplo do que gente escrevendo blogs ou enviando fotos para websites. Trata-se do cidadão buscando informação com mais autonomia. Antes havia o monopólio da notícia, e os jornalistas eram praticamente as únicas pessoas que podiam produzir e distribuir notícias. Agora o processo é muito menos intermediado e isso significa que a imprensa vai ter que mudar sua forma de agir.
O cenário é tão apocalíptico assim?
BECKETT: Nem tanto. Embora as margens de lucro estejam caindo, veículos de mídia ainda movimentam um bom dinheiro, sem falar que o público quer mais informação, mais debate para ajudá-lo a tomar decisões, de fatores corriqueiros como seleção de escolas à escolha dos políticos em que deve votar. O jornalismo precisa voltar às raízes de prestação de serviços, pois em meio ao cenário que se vê na mídia digital veículos estabelecidos ainda contam com a força de sua marca. Isso, por exemplo, explica um pouco o sucesso da BBC on-line. As pessoas ainda confiam em marcas associadas ao jornalismo de qualidade.
Pode-se falar também numa mudança de dinâmica, não?
BECKETT: O jornalismo vai ter que mudar um pouco a visão de produto que dominou o setor nas últimas décadas. Terá que ser cada vez mais um serviço e os profissionais de imprensa precisarão estar mais sintonizados com o que leitores, ouvintes ou telespectadores consideram útil, mas também há demanda por aspectos em que as pessoas ainda não pensaram. Num plano geral, o jornalismo terá que se encaixar na vida das pessoas, não o contrário. Não é mais aquela coisa de o telejornal começar às nove da noite e as pessoas terem que esperar, pois agora há oferta de notícias 24 horas por dia. Nesse sentido, cativar a atenção do público será quase tão importante quanto conquistar sua confiança...
Fala-se muito no investimento em mais notícias de caráter local para conquistar audiência. Você concorda?
BECKETT: As novas tecnologias simplificaram a interação com a audiência e isso deveria ser aproveitado. Não é uma questão de parar de falar sobre incidentes, mas quem sabe contextualizá-los mais de acordo com os interesses da comunidade afetada, pois essa é a maneira de mostrar a ela que o jornalismo faz parte de suas vidas.
O que você acha de iniciativas como comentários em artigos eletrônicos e as possibilidades de envio de conteúdo por parte de amadores para veículos profissionais?
BECKETT: Fala-se muito em mídia sobre a regra do “um por cento”, isto é, de que apenas um por cento de sua audiência vai se dar ao trabalho de contribuir e participar. Mas um por cento de um milhão de leitores, por exemplo, é um bando de gente oferecendo ajuda e contribuindo, muitas vezes de graça. Mesmo fatos simples como o leitor que fotografa um buraco na rua são um bom exemplo de serviço genuíno. Não adianta pensar apenas em derrubar governos — o público gosta de saber também se a escola do bairro está aberta. Há exemplos de colaborações deste tipo, como no caso de jornais do sul dos EUA que obtiveram informações de leitores sobre o furacão Katrina. Elas ajudaram na construção de grandes histórias sobre o atraso no repasse das verbas do governo americano, por exemplo.
Em “SuperMedia” você fala muito na mudança do perfil do profissional da área. O quão radicalmente ele precisa mudar?
BECKETT: É impossível prever de que tipo de profissionais vamos precisar, mas é claro que gente com boa habilidade para processar informações e se expressar sempre terá espaço. Jornalistas, porém, terão de ser mais flexíveis, visualizando além do trabalho cotidiano. Refletir se estão apenas fazendo o que o editor mandou ou se pensam que alguém lá fora está realmente precisando do tipo de informação que produzem. O novo jornalista terá que saber mais sobre seu público.
Não soa como uma mudança fácil para profissionais mais veteranos.
BECKETT: Creio que muitas vagas serão extintas nos próximos anos. Mas traço um paralelo com a indústria automobilística: a automação tirou o emprego de muita gente, mas carros continuam sendo fabricados com envolvimento humano, só que essas pessoas estão mais envolvidas com o resto da produção do que somente martelando pedaços de metal.
O que dizer das teorias de diversificação do jornal como plataforma de serviço?
BECKETT: É uma forma viável, pois não aposta somente numa faceta do que uma marca confiável pode oferecer. O “Guardian” (jornal diário britânico), por exemplo, hoje age como intermediário até em serviços de aluguel de DVDs. Organizações terão que criar redes de serviços para manter interesse da audiência. Algo além do comercial, diga-se de passagem: a BBC, por exemplo, está estudando envolver-se mais diretamente na organização de campanhas educativas pelo Reino Unido num plano mais local do que meramente institucional.
Em livro, repórter identifica tendências e dilemas do meio, que para ele deve se renovar: ‘Jornal é para quem quer ler’
As especulações sobre uma possível extinção dos jornais impressos têm sido alimentadas nos últimos anos por sucessivas quedas na circulação, concorrência crescente de blogs e sites com informação em tempo real, e por mudanças na relação entre produtor e consumidor de conteúdo causadas pela internet. Em “O destino do jornal” (Record), Lourival Sant’Anna recorre a livros, pesquisas e a entrevistas com diretores de redação dos três maiores jornais brasileiros (O GLOBO, “Folha de S. Paulo” e “Estado de S. Paulo”) para dar ao leitor um panorama geral da questão. Sant’Anna, jornalista do “Estado de S. Paulo”, expõe dilemas e tendências do mercado, mas é prudente na hora de fazer previsões. Em entrevista ao GLOBO, ele diz acreditar que haverá espaço para os jornais no futuro, desde que eles consigam se reformular.
Miguel Conde: Nos últimos anos, a circulação dos jornais brasileiros cresceu, na contramão do que acontece em vários países. Como você explicaria o fenômeno?
LOURIVAL SANT’ANNA: O atual aumento da circulação e da receita publicitária dos jornais é coerente com o crescimento da economia. Isso é normal: quando a economia cresce, aumentam o consumo de informação (como de outros produtos e serviços) e o investimento publicitário. Mostro no meu livro que na primeira metade da década ocorreu um descolamento entre circulação e crescimento econômico no Brasil. Entre 2001 e 2003, a economia brasileira cresceu, embora não muito, e a circulação diminuiu. Em 2004, a economia cresceu mais que nos anos anteriores e a circulação aumentou, porém menos do que a economia. A partir de 2005, a tendência se inverteu: a circulação está crescendo mais que a economia. O que isso mostra é que houve um refluxo depois da bolha de circulação dos anos 90, impulsionada pelos anabolizantes (os brindes que acompanhavam os jornais).
No livro, os entrevistados fazem avaliações negativas do jornalismo na internet. Concorda com elas? As fraquezas da internet são inerentes ao meio, ou podem ser resolvidas?
SANT’ANNA: Parte das deficiências do jornalismo feito na internet está relacionada com o fato de que as empresas ainda estão aprendendo a ganhar dinheiro com esse negócio. Por isso, o investimento nas redações — jornalistas, custos de reportagem, viagens, coberturas de fôlego etc. — é ainda muito baixo. Os meios on-line se valem muito da cobertura feita por meios tradicionais, notadamente os jornais, que são os que têm as maiores redações e estão mais estruturados para a reportagem. Outra parte das deficiências pode ser estrutural, pode estar relacionada ao próprio meio internet. A internet abre novas possibilidades de interação da audiência com o meio de comunicação. Ela tende a eliminar a dicotomia emissor-receptor, tornando seus usuários ao mesmo tempo consumidores e produtores de informação. O usuário deseja intervir na própria hierarquização da informação, e vários sites e portais utilizam ferramentas para permitir que isso ocorra automaticamente: os links mais acessados sobem para o alto da tela. São demandas naturais da audiência da internet. Mas contradizem a própria noção de jornalismo. O que é um repórter? Um profissional treinado que recebe condição de trabalho para apurar a informação utilizando como critérios a isenção e o interesse público, em vez do particular. E o editor? Outro profissional treinado para atribuir forma e importância à informação, usando os mesmos critérios. Há falhas nisso? Lógico que há. Mas o jornalismo consiste na tentativa de se alcançar esse objetivo, e implica até mesmo a consciência das dificuldades que se interpõem no caminho. Quando um meio renuncia aos trabalhos de apuração e hierarquização da informação, ele desistiu, sem tentar, de fazer jornalismo.
Um dos pontos mais delicados apontados por você é a aproximação, nos sites jornalísticos, dos setores editorial e comercial. Quais são as conseqüências dessa proximidade?
SANT’ANNA: Esse é outro aspecto do mesmo problema. O exemplo bilionário do Google indica que a internet dará dinheiro não com anúncios publicitários convencionais, mas com o link patrocinado. Aplicada aos sites jornalísticos, essa técnica implica transformar palavras do texto informativo em links para operações comerciais e de marketing. Tanto que em alguns sites há a figura de um gerente que faz a ponte entre a redação e o comercial. Repare que a internet acrescentou uma palavra ao jargão jornalístico: conteúdo. Creio que essa palavra exprime essa zona cinzenta entre informação e publicidade. Corre-se o risco de se aceitar a interferência do departamento comercial na elaboração das pautas. Quase posso ouvir o gerente de conteúdo anunciando na reunião de pauta: “Precisamos fazer uma matéria que tenha a palavra sabonete porque tenho um cliente para um link patrocinado”. Seria o fim da chamada separação Igreja-Estado, que é a chave da credibilidade do jornalismo.
Os diretores de redação entrevistados por você apontam alguns caminhos para os jornais lidarem com o crescimento da internet, como reportagens especiais e um viés mais “interpretativo” das edições. Você vê isso acontecendo?
SANT’ANNA: Ainda não. Os jornais continuam despendendo a maior parte de sua energia tentando contar para seus leitores o que aconteceu ontem. Os leitores já sabem isso: viram no computador do escritório, receberam pelo celular, ouviram no rádio e ainda tiveram a chance de confirmar tudo à noite, pela TV. Mas as redações estão estruturadas para a notícia no seu estado, digamos, bruto. São muito grandes, com muitos jornalistas, condicionados a apenas noticiar os fatos, reproduzir dados e transcrever declarações. Não é assim que o jornal vai se diferenciar dos outros meios e assegurar o seu espaço no mercado. O jornal tem de investir naquilo que ele faz melhor que outros: contar a história, com começo, meio e fim, com uma narrativa que dê prazer e sentido à notícia; contextualizar e interpretar. Essa é uma transição muito difícil. O jornal não pode, da noite para o dia, renunciar à notícia e abraçar a narrativa, a interpretação e o contexto. Mas precisamos começar já, ou não vamos sobreviver, porque outros meios farão melhor o que fazemos.
Qual é a linha entre jornalismo interpretativo e simplesmente editorializado? Os jornais assumirão postura mais opinativa em seu noticiário?
SANT’ANNA: Acho que a opinião tem o seu espaço nos jornais — por sinal bastante nobre. Não acho que precisamos de mais opinião. Como repórter, exposto cotidianamente à complexidade do mundo, acho que o valor agregado do jornal — e do jornalismo — é a informação, não a impressão pessoal. Por isso, prefiro falar em “interpretação”: uma síntese da informação com a capacidade de compreensão, baseada em referências históricas, culturais, geográficas, econômicas etc. É um grande equívoco pensar que a opinião pode suprir a demanda pela informação. É buscar um atalho que só leva a perder-se nessa floresta de impressões, de dados, de narrativas desconexas em que o ambiente digital pode converter-se, se não houver um trabalho profissional de organização e depuração que resulte em informação.
Os principais jornais brasileiros ainda preparam a fusão de suas equipes de internet e impresso. Você acredita que essas fusões resultarão em enxugamentos das redações e numa piora editorial?
SANT’ANNA: Sempre que houver crises, ou aumento de pressões por lucros, a “convergência” servirá de desculpa para cortes de custos e de investimentos. Mas as empresas que virem isso como estratégia de negócio tenderão a perder os valores intangíveis que explicam a rentabilidade desse setor: influência, prestígio, credibilidade, enfim, as qualidades que cimentam a adesão dos leitores aos jornais. Quem trabalha em grandes jornais, como você e eu, sabe o valor do jornal para muitos leitores. É como se ele fizesse parte de suas vidas, ao longo de décadas. Isso se sente na reação irada quando os decepcionamos. Eles reagem como se tivessem sido traídos na sua confiança e dedicação. E de fato foram. Um dos esforços maiores do meu livro está em mostrar como esses valores se traduzem em rentabilidade.
Um dos dilemas que seu livro aponta é a dificuldade dos jornais em atrair jovens leitores. Existe alguma experiência bem sucedida nesse campo? Por que a dificuldade, em sua opinião?
SANT’ANNA: Com a transição geracional, uma fatia cada vez maior do nosso público-alvo cresceu diante do videogame e do computador. Até por sua conformação neurológica, adaptada ao brilho e aos estímulos da tela, o jornal pode parecer opaco, lento, tedioso. Acho um engano, em resposta a isso, tentar mimetizar os meios eletrônicos, transfigurar o jornal em algo que ele não pode ser. Ele perderia o que tem e não ganharia o que supostamente lhe faz falta. Jornal é para quem quer ler. Isso não quer dizer que ele tenha de ser sisudo, chato. Pelo contrário. A experiência da leitura pode ser extremamente prazerosa. É nisso que o jornal tem de se transformar.
É possível fazer um paralelo entre o momento atual, de crescimento dos blogs, e os primórdios da imprensa, quando os jornais eram muitas vezes empresas individuais de matriz claramente opinativa?
SANT’ANNA: Sem dúvida, há semelhanças. Os jornais também nasceram predominantemente opinativos, ideologizados, engajados. A reportagem que busca a isenção (de novo, consciente das dificuldades de alcançá-la, mas sem desistir dela) é também produto (além de causa) da rentabilidade dos jornais. Custa dinheiro apurar informação de forma profissional. É bem mais cômodo e barato sentar-se numa cadeira e discorrer acerca do mundo. Os blogs têm um papel interessante de expressão de pontos de vista e de experiências. Eles terão o seu espaço. Mas hoje ele está superdimensionado pela falta de recursos dos meios on-line. Quando eles forem mais robustos comercialmente, creio que os blogs cederão parte de seu espaço para outras formas mais sofisticadas de informação.
Houve um tempo em que a difusão de textos, sons, imagens era atividade exclusiva de grandes empresas capazes de arcar com custos altíssimos de impressão, filmagem, gravação, transporte. Essa época ficou para trás. Nos últimos anos, enquanto os computadores barateavam os processos de produção e edição, os blogs, páginas pessoais e ferramentas de compartilhamento de dados fizeram de qualquer usuário da internet um produtor de conteúdo em potencial. Uma verdadeira quebra de monopólio, que forçou as empresas de mídia a repensarem o relacionamento com seus leitores, espectadores, ouvintes, hoje marcado por uma aproximação crescente. Com os papéis de emissor e receptor mais embolados do que nunca, a imprensa deixou de ser fonte única de notícias e análises sobre os fatos, e viu parte de seus anunciantes migrarem para outros setores. Essas mudanças, que vêm sendo observadas em diversos cantos do mundo, inclusive no Brasil — que comemora este mês os 200 anos de criação da imprensa —, são o assunto de vários livros recentes abordados em entrevistas aqui.
‘Cada vez mais um serviço’. Pesquisador inglês afirma ser esse o caminho de sobrevivência do jornalismo nos tempos da internet
O jornalista inglês Charlie Beckett acha que para adaptar-se às mudanças trazidas pela internet a mídia terá que se aproximar dos leitores e pensar a si mesma cada vez mais como um serviço. Diretor do Polis, o think tank de mídia da London School of Economics, ele acaba de lançar na Inglaterra (Wiley-Blackwell, 216 páginas) um livro sobre o assunto: “SuperMedia: saving journalism so it can save the world”. Em entrevista ao GLOBO, em Londres, ele discute as principais idéias da sua obra.
Fernando Duarte: Qual é a sua análise da crise do jornalismo?
CHARLIE BECKETT: Não é somente uma questão de crise, mas de oportunidade. Com base em 20 anos de experiência profissional e no trabalho acadêmico no Polis, vejo que o jornalismo passou nos últimos anos e passará pelos próximos por mudanças nunca vistas antes. Chegamos a um ponto em que teremos de decidir que tipo de mídia queremos. Vivemos numa época em que a mídia digital chegou para ficar e em que as pessoas estão cada vez mais antenadas em relação aos acontecimentos. Aliada ao desenvolvimento tecnológico, a mídia hoje pode fazer por nós coisas que eram fisicamente impossíveis.
No entanto, diversos veículos de mídia europeus têm realizado estudos falando num futuro pessimista...
BECKETT: Sim, o modelo econômico tradicional está em crise, especialmente nos mercados mais tradicionais. No caso de anunciantes, por exemplo, eles estão deixando veículos tradicionais e não necessariamente surgindo nas versões on-line. Antes, bastava aparecer perto de notícias e torcer para seu produto ser comprado, mas anunciantes agora percebem que podem se conectar mais diretamente com o público, anunciando em ferramentas de busca, por exemplo. Sei que a mídia em lugares como Índia e Brasil ainda segue um modelo mais tradicional, mas na Europa o bolo de receitas publicitárias da mídia tradicional está encolhendo. É uma ameaça ao jornalismo de qualidade.
Em “SuperMedia” você também fala numa certa admissão de derrota por parte da mídia tradicional. Por quê?
BECKETT: Porque a tal guerra entre velha e nova mídia acabou e todo mundo hoje em dia é digital de uma certa maneira. Mesmo que você esteja escrevendo algo tão “antiquado” quanto um livro, você pesquisa on-line e conversa com as pessoas via e-mail. Não é mais uma questão de escolha também em relação ao tal jornalismo do cidadão, embora o conceito para mim seja muito mais amplo do que gente escrevendo blogs ou enviando fotos para websites. Trata-se do cidadão buscando informação com mais autonomia. Antes havia o monopólio da notícia, e os jornalistas eram praticamente as únicas pessoas que podiam produzir e distribuir notícias. Agora o processo é muito menos intermediado e isso significa que a imprensa vai ter que mudar sua forma de agir.
O cenário é tão apocalíptico assim?
BECKETT: Nem tanto. Embora as margens de lucro estejam caindo, veículos de mídia ainda movimentam um bom dinheiro, sem falar que o público quer mais informação, mais debate para ajudá-lo a tomar decisões, de fatores corriqueiros como seleção de escolas à escolha dos políticos em que deve votar. O jornalismo precisa voltar às raízes de prestação de serviços, pois em meio ao cenário que se vê na mídia digital veículos estabelecidos ainda contam com a força de sua marca. Isso, por exemplo, explica um pouco o sucesso da BBC on-line. As pessoas ainda confiam em marcas associadas ao jornalismo de qualidade.
Pode-se falar também numa mudança de dinâmica, não?
BECKETT: O jornalismo vai ter que mudar um pouco a visão de produto que dominou o setor nas últimas décadas. Terá que ser cada vez mais um serviço e os profissionais de imprensa precisarão estar mais sintonizados com o que leitores, ouvintes ou telespectadores consideram útil, mas também há demanda por aspectos em que as pessoas ainda não pensaram. Num plano geral, o jornalismo terá que se encaixar na vida das pessoas, não o contrário. Não é mais aquela coisa de o telejornal começar às nove da noite e as pessoas terem que esperar, pois agora há oferta de notícias 24 horas por dia. Nesse sentido, cativar a atenção do público será quase tão importante quanto conquistar sua confiança...
Fala-se muito no investimento em mais notícias de caráter local para conquistar audiência. Você concorda?
BECKETT: As novas tecnologias simplificaram a interação com a audiência e isso deveria ser aproveitado. Não é uma questão de parar de falar sobre incidentes, mas quem sabe contextualizá-los mais de acordo com os interesses da comunidade afetada, pois essa é a maneira de mostrar a ela que o jornalismo faz parte de suas vidas.
O que você acha de iniciativas como comentários em artigos eletrônicos e as possibilidades de envio de conteúdo por parte de amadores para veículos profissionais?
BECKETT: Fala-se muito em mídia sobre a regra do “um por cento”, isto é, de que apenas um por cento de sua audiência vai se dar ao trabalho de contribuir e participar. Mas um por cento de um milhão de leitores, por exemplo, é um bando de gente oferecendo ajuda e contribuindo, muitas vezes de graça. Mesmo fatos simples como o leitor que fotografa um buraco na rua são um bom exemplo de serviço genuíno. Não adianta pensar apenas em derrubar governos — o público gosta de saber também se a escola do bairro está aberta. Há exemplos de colaborações deste tipo, como no caso de jornais do sul dos EUA que obtiveram informações de leitores sobre o furacão Katrina. Elas ajudaram na construção de grandes histórias sobre o atraso no repasse das verbas do governo americano, por exemplo.
Em “SuperMedia” você fala muito na mudança do perfil do profissional da área. O quão radicalmente ele precisa mudar?
BECKETT: É impossível prever de que tipo de profissionais vamos precisar, mas é claro que gente com boa habilidade para processar informações e se expressar sempre terá espaço. Jornalistas, porém, terão de ser mais flexíveis, visualizando além do trabalho cotidiano. Refletir se estão apenas fazendo o que o editor mandou ou se pensam que alguém lá fora está realmente precisando do tipo de informação que produzem. O novo jornalista terá que saber mais sobre seu público.
Não soa como uma mudança fácil para profissionais mais veteranos.
BECKETT: Creio que muitas vagas serão extintas nos próximos anos. Mas traço um paralelo com a indústria automobilística: a automação tirou o emprego de muita gente, mas carros continuam sendo fabricados com envolvimento humano, só que essas pessoas estão mais envolvidas com o resto da produção do que somente martelando pedaços de metal.
O que dizer das teorias de diversificação do jornal como plataforma de serviço?
BECKETT: É uma forma viável, pois não aposta somente numa faceta do que uma marca confiável pode oferecer. O “Guardian” (jornal diário britânico), por exemplo, hoje age como intermediário até em serviços de aluguel de DVDs. Organizações terão que criar redes de serviços para manter interesse da audiência. Algo além do comercial, diga-se de passagem: a BBC, por exemplo, está estudando envolver-se mais diretamente na organização de campanhas educativas pelo Reino Unido num plano mais local do que meramente institucional.
Em livro, repórter identifica tendências e dilemas do meio, que para ele deve se renovar: ‘Jornal é para quem quer ler’
As especulações sobre uma possível extinção dos jornais impressos têm sido alimentadas nos últimos anos por sucessivas quedas na circulação, concorrência crescente de blogs e sites com informação em tempo real, e por mudanças na relação entre produtor e consumidor de conteúdo causadas pela internet. Em “O destino do jornal” (Record), Lourival Sant’Anna recorre a livros, pesquisas e a entrevistas com diretores de redação dos três maiores jornais brasileiros (O GLOBO, “Folha de S. Paulo” e “Estado de S. Paulo”) para dar ao leitor um panorama geral da questão. Sant’Anna, jornalista do “Estado de S. Paulo”, expõe dilemas e tendências do mercado, mas é prudente na hora de fazer previsões. Em entrevista ao GLOBO, ele diz acreditar que haverá espaço para os jornais no futuro, desde que eles consigam se reformular.
Miguel Conde: Nos últimos anos, a circulação dos jornais brasileiros cresceu, na contramão do que acontece em vários países. Como você explicaria o fenômeno?
LOURIVAL SANT’ANNA: O atual aumento da circulação e da receita publicitária dos jornais é coerente com o crescimento da economia. Isso é normal: quando a economia cresce, aumentam o consumo de informação (como de outros produtos e serviços) e o investimento publicitário. Mostro no meu livro que na primeira metade da década ocorreu um descolamento entre circulação e crescimento econômico no Brasil. Entre 2001 e 2003, a economia brasileira cresceu, embora não muito, e a circulação diminuiu. Em 2004, a economia cresceu mais que nos anos anteriores e a circulação aumentou, porém menos do que a economia. A partir de 2005, a tendência se inverteu: a circulação está crescendo mais que a economia. O que isso mostra é que houve um refluxo depois da bolha de circulação dos anos 90, impulsionada pelos anabolizantes (os brindes que acompanhavam os jornais).
No livro, os entrevistados fazem avaliações negativas do jornalismo na internet. Concorda com elas? As fraquezas da internet são inerentes ao meio, ou podem ser resolvidas?
SANT’ANNA: Parte das deficiências do jornalismo feito na internet está relacionada com o fato de que as empresas ainda estão aprendendo a ganhar dinheiro com esse negócio. Por isso, o investimento nas redações — jornalistas, custos de reportagem, viagens, coberturas de fôlego etc. — é ainda muito baixo. Os meios on-line se valem muito da cobertura feita por meios tradicionais, notadamente os jornais, que são os que têm as maiores redações e estão mais estruturados para a reportagem. Outra parte das deficiências pode ser estrutural, pode estar relacionada ao próprio meio internet. A internet abre novas possibilidades de interação da audiência com o meio de comunicação. Ela tende a eliminar a dicotomia emissor-receptor, tornando seus usuários ao mesmo tempo consumidores e produtores de informação. O usuário deseja intervir na própria hierarquização da informação, e vários sites e portais utilizam ferramentas para permitir que isso ocorra automaticamente: os links mais acessados sobem para o alto da tela. São demandas naturais da audiência da internet. Mas contradizem a própria noção de jornalismo. O que é um repórter? Um profissional treinado que recebe condição de trabalho para apurar a informação utilizando como critérios a isenção e o interesse público, em vez do particular. E o editor? Outro profissional treinado para atribuir forma e importância à informação, usando os mesmos critérios. Há falhas nisso? Lógico que há. Mas o jornalismo consiste na tentativa de se alcançar esse objetivo, e implica até mesmo a consciência das dificuldades que se interpõem no caminho. Quando um meio renuncia aos trabalhos de apuração e hierarquização da informação, ele desistiu, sem tentar, de fazer jornalismo.
Um dos pontos mais delicados apontados por você é a aproximação, nos sites jornalísticos, dos setores editorial e comercial. Quais são as conseqüências dessa proximidade?
SANT’ANNA: Esse é outro aspecto do mesmo problema. O exemplo bilionário do Google indica que a internet dará dinheiro não com anúncios publicitários convencionais, mas com o link patrocinado. Aplicada aos sites jornalísticos, essa técnica implica transformar palavras do texto informativo em links para operações comerciais e de marketing. Tanto que em alguns sites há a figura de um gerente que faz a ponte entre a redação e o comercial. Repare que a internet acrescentou uma palavra ao jargão jornalístico: conteúdo. Creio que essa palavra exprime essa zona cinzenta entre informação e publicidade. Corre-se o risco de se aceitar a interferência do departamento comercial na elaboração das pautas. Quase posso ouvir o gerente de conteúdo anunciando na reunião de pauta: “Precisamos fazer uma matéria que tenha a palavra sabonete porque tenho um cliente para um link patrocinado”. Seria o fim da chamada separação Igreja-Estado, que é a chave da credibilidade do jornalismo.
Os diretores de redação entrevistados por você apontam alguns caminhos para os jornais lidarem com o crescimento da internet, como reportagens especiais e um viés mais “interpretativo” das edições. Você vê isso acontecendo?
SANT’ANNA: Ainda não. Os jornais continuam despendendo a maior parte de sua energia tentando contar para seus leitores o que aconteceu ontem. Os leitores já sabem isso: viram no computador do escritório, receberam pelo celular, ouviram no rádio e ainda tiveram a chance de confirmar tudo à noite, pela TV. Mas as redações estão estruturadas para a notícia no seu estado, digamos, bruto. São muito grandes, com muitos jornalistas, condicionados a apenas noticiar os fatos, reproduzir dados e transcrever declarações. Não é assim que o jornal vai se diferenciar dos outros meios e assegurar o seu espaço no mercado. O jornal tem de investir naquilo que ele faz melhor que outros: contar a história, com começo, meio e fim, com uma narrativa que dê prazer e sentido à notícia; contextualizar e interpretar. Essa é uma transição muito difícil. O jornal não pode, da noite para o dia, renunciar à notícia e abraçar a narrativa, a interpretação e o contexto. Mas precisamos começar já, ou não vamos sobreviver, porque outros meios farão melhor o que fazemos.
Qual é a linha entre jornalismo interpretativo e simplesmente editorializado? Os jornais assumirão postura mais opinativa em seu noticiário?
SANT’ANNA: Acho que a opinião tem o seu espaço nos jornais — por sinal bastante nobre. Não acho que precisamos de mais opinião. Como repórter, exposto cotidianamente à complexidade do mundo, acho que o valor agregado do jornal — e do jornalismo — é a informação, não a impressão pessoal. Por isso, prefiro falar em “interpretação”: uma síntese da informação com a capacidade de compreensão, baseada em referências históricas, culturais, geográficas, econômicas etc. É um grande equívoco pensar que a opinião pode suprir a demanda pela informação. É buscar um atalho que só leva a perder-se nessa floresta de impressões, de dados, de narrativas desconexas em que o ambiente digital pode converter-se, se não houver um trabalho profissional de organização e depuração que resulte em informação.
Os principais jornais brasileiros ainda preparam a fusão de suas equipes de internet e impresso. Você acredita que essas fusões resultarão em enxugamentos das redações e numa piora editorial?
SANT’ANNA: Sempre que houver crises, ou aumento de pressões por lucros, a “convergência” servirá de desculpa para cortes de custos e de investimentos. Mas as empresas que virem isso como estratégia de negócio tenderão a perder os valores intangíveis que explicam a rentabilidade desse setor: influência, prestígio, credibilidade, enfim, as qualidades que cimentam a adesão dos leitores aos jornais. Quem trabalha em grandes jornais, como você e eu, sabe o valor do jornal para muitos leitores. É como se ele fizesse parte de suas vidas, ao longo de décadas. Isso se sente na reação irada quando os decepcionamos. Eles reagem como se tivessem sido traídos na sua confiança e dedicação. E de fato foram. Um dos esforços maiores do meu livro está em mostrar como esses valores se traduzem em rentabilidade.
Um dos dilemas que seu livro aponta é a dificuldade dos jornais em atrair jovens leitores. Existe alguma experiência bem sucedida nesse campo? Por que a dificuldade, em sua opinião?
SANT’ANNA: Com a transição geracional, uma fatia cada vez maior do nosso público-alvo cresceu diante do videogame e do computador. Até por sua conformação neurológica, adaptada ao brilho e aos estímulos da tela, o jornal pode parecer opaco, lento, tedioso. Acho um engano, em resposta a isso, tentar mimetizar os meios eletrônicos, transfigurar o jornal em algo que ele não pode ser. Ele perderia o que tem e não ganharia o que supostamente lhe faz falta. Jornal é para quem quer ler. Isso não quer dizer que ele tenha de ser sisudo, chato. Pelo contrário. A experiência da leitura pode ser extremamente prazerosa. É nisso que o jornal tem de se transformar.
É possível fazer um paralelo entre o momento atual, de crescimento dos blogs, e os primórdios da imprensa, quando os jornais eram muitas vezes empresas individuais de matriz claramente opinativa?
SANT’ANNA: Sem dúvida, há semelhanças. Os jornais também nasceram predominantemente opinativos, ideologizados, engajados. A reportagem que busca a isenção (de novo, consciente das dificuldades de alcançá-la, mas sem desistir dela) é também produto (além de causa) da rentabilidade dos jornais. Custa dinheiro apurar informação de forma profissional. É bem mais cômodo e barato sentar-se numa cadeira e discorrer acerca do mundo. Os blogs têm um papel interessante de expressão de pontos de vista e de experiências. Eles terão o seu espaço. Mas hoje ele está superdimensionado pela falta de recursos dos meios on-line. Quando eles forem mais robustos comercialmente, creio que os blogs cederão parte de seu espaço para outras formas mais sofisticadas de informação.
O Outro Lado da Moeda
Os jornalistas do Jornal O Dia, Marlos Mendes e Gustavo de Almeida, são os próximos convidados do Ciclo de Palestras. Eles vão debater sobre o relacionamento da imprensa com os Assessores de Comunicação.
O Ciclo de Palestras já trouxe Assessores de Comunicação de diferentes esferas para falarem sobre os seus trabalhos. Agora é a vez de jornalistas discutirem um pouco sobre a relação dos assessores com a mídia.
Marlos Mendes, formado em Jornalismo pela UFF, é repórter e subeditor de Informática do Jornal O Dia. Além disso, é responsável pelo blog “Digitais” de O Dia Online. Também formado em Jornalismo pela UFF, Gustavo de Almeida é editor-substituto e repórter especial de Polícia de O Dia. No Online, Gustavo é editor-assistente do “Blog de Segurança”.
Ambos prometem dar uma visão realista do mercado jornalístico. Mas a palestra terá mais a cara de um bate-papo informal entre alunos e ex-alunos. Marlos e Gustavo falarão sobre o bom (e o mau) relacionamento dos Assessores com a Imprensa, as dificuldades de acesso ao assessorado, os assédios desnecessários e sobre a importância do trabalho dos assessores para a alimentação do noticiário.
Os interessados poderão conferir esta conversa na próxima quinta-feira, 26/06, às 20h, na sala C-100 do Instituto de Artes e Comunicação Social (IACS) da UFF. E, como não poderia ser diferente, o evento é gratuito e aberto ao público.
Esta é a última palestra do Ciclo organizado por alunos de assessoria de comunicação do curso de Estudos de Mídia/UFF. Durante os meses de maio e junho, o evento trouxe profissionais de assessoria de imprensa para debaterem sobre o contexto político da relação assessores, assessorados e imprensa.
Se você perdeu alguma palestra, poderá conferir entrevistas com todos os convidados, fotos e comentários no nosso site. Basta acessar: www.uff.br/ecin/ascon. Outras informações sobre o Ciclo de Palestras podem ser obtidas pelos e-mails: klebersm@hotmail.com, claudinne.peixoto@gmail.com ou rebecca.rcm@gmail.com.
O Ciclo de Palestras já trouxe Assessores de Comunicação de diferentes esferas para falarem sobre os seus trabalhos. Agora é a vez de jornalistas discutirem um pouco sobre a relação dos assessores com a mídia.
Marlos Mendes, formado em Jornalismo pela UFF, é repórter e subeditor de Informática do Jornal O Dia. Além disso, é responsável pelo blog “Digitais” de O Dia Online. Também formado em Jornalismo pela UFF, Gustavo de Almeida é editor-substituto e repórter especial de Polícia de O Dia. No Online, Gustavo é editor-assistente do “Blog de Segurança”.
Ambos prometem dar uma visão realista do mercado jornalístico. Mas a palestra terá mais a cara de um bate-papo informal entre alunos e ex-alunos. Marlos e Gustavo falarão sobre o bom (e o mau) relacionamento dos Assessores com a Imprensa, as dificuldades de acesso ao assessorado, os assédios desnecessários e sobre a importância do trabalho dos assessores para a alimentação do noticiário.
Os interessados poderão conferir esta conversa na próxima quinta-feira, 26/06, às 20h, na sala C-100 do Instituto de Artes e Comunicação Social (IACS) da UFF. E, como não poderia ser diferente, o evento é gratuito e aberto ao público.
Esta é a última palestra do Ciclo organizado por alunos de assessoria de comunicação do curso de Estudos de Mídia/UFF. Durante os meses de maio e junho, o evento trouxe profissionais de assessoria de imprensa para debaterem sobre o contexto político da relação assessores, assessorados e imprensa.
Se você perdeu alguma palestra, poderá conferir entrevistas com todos os convidados, fotos e comentários no nosso site. Basta acessar: www.uff.br/ecin/ascon. Outras informações sobre o Ciclo de Palestras podem ser obtidas pelos e-mails: klebersm@hotmail.com, claudinne.peixoto@gmail.com ou rebecca.rcm@gmail.com.
quarta-feira, 11 de junho de 2008
Pesquisa do Ipea mostra que cerca de 90% da juventude do país não consomem atividades e bens culturais
Debate - Alessandra Duarte - Jornal O Globo - 08/06/2008
‘O último filme que vi no cinema foi ‘X-Men 2’, conta Flávio Anastácio da Costa, de 20 anos.
Será que não foi o 3, de 2006, o longa mais recente da série, em vez do 2, lançado há cinco anos?
— Não, foi o 2 mesmo.
Morador da Cidade de Deus, favela na Zona Oeste do Rio, Flávio Anastácio está acompanhado por 93,7% da população de jovens do país. Essa é a parcela de jovens de 15 a 29 anos no Brasil que não consome cinema, segundo um estudo publicado em abril deste ano pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Chamada “Juventude e políticas sociais no Brasil”, a pesquisa mostra o perfil de consumo de cultura dos jovens brasileiros. A principal conclusão a que se chega com os dados do estudo: levando em conta apenas as atividades e bens culturais pagos, cerca de 90% da juventude brasileira não consomem cultura.
Baseado em dados da última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2003, o estudo aponta que o item mais consumido pelos jovens são os jornais e revistas: 7,1% dos pesquisados compram algum periódico (pelo menos uma vez por mês, a periodicidade que a pesquisa leva em conta para dizer que aquele bem é consumido). Em seguida, vêm os vídeos (onde entram os DVDs), consumidos no mínimo uma vez por mês por 6,5%; cinema, com 6,3%; CDs de música, com 4,4%; e livros didáticos, com 4,2% (aqui entra o fato de que boa parte das famílias recebe livros didáticos gratuitos, pela política do governo federal de popularização desse material).
Entre os menos consumidos, peças e livros
Os menos votados foram teatro, consumido por apenas 2,8% dos jovens, e livros (excluindo os didáticos), com 1,7%. Há ainda o item “Outras saídas”, no qual entram boates, festas, shows e bailes, consumido por 8,4% dos jovens.
Flávio Anastácio, por exemplo, nem lembra a última vez em que foi ao teatro. Mas toda semana vai a alguma apresentação de break no núcleo da Central Única das Favelas (Cufa) na Cidade de Deus, onde mora, ou a alguma lanhouse ou locadora de filmes do local. Como a Sucilla, há 16 anos lá e onde o filme mais alugado, de longe, é... “Cidade de Deus”.
— Quando o DVD saiu, eu tinha dez cópias e as dez ficavam alugadas todo dia — diz Antônia Cardoso, uma das donas da locadora, com cinco mil associados.
Bailes charme e funk — que entram na categoria “Outras saídas” — também estão na lista de compras culturais da juventude da região.
— Aqui são uns três bailes, todo fim de semana. No baile Lar de Prata, a mania agora é ver qual galera é a maior e tem a melhor fantasia: existe a galera do boné, que vai para o baile de boné; o bonde da raquete, que vai com raquete de tênis; a galera do mototáxi, que vai de capacete... Tem uma que foi uma vez de “Hulk”, com todos pintados de verde — conta Gabriel Pessoa Ferreira, de 21 anos, outro morador da Cidade de Deus.
Pesquisa aponta o peso dos caros ingressos de teatro
O estudo do Ipea mostra também o gasto médio mensal dos jovens com cultura. Apesar de ir pouco ao teatro, é com ele o maior gasto per capita mensal dos jovens, entre aqueles consumidores de cultura: R$403. O que indicaria o quanto o preço do ingresso de teatro é alto: nas poucas vezes em que o jovem vai a uma peça, gasta muito, e o suficiente para que esse seja seu maior gasto em cultura.
O segundo maior gasto (excluindo-se a categoria “Outras saídas”, com R$400) é com CDs (R$237), seguido por periódicos (R$235), vídeos (R$190), cinema (R$186), livros (R$157) e livros didáticos (R$94).
A pesquisa revela ainda as desigualdades de acesso à cultura segundo a escolaridade. Quando se vai para a parcela dos jovens com 12 anos ou mais de estudo (os universitários), o percentual de jovens que consomem cultura e o gasto deles com ações e bens culturais se multiplicam por até seis vezes.
Se só 6,3% dos jovens, no total, vão ao cinema, esse número sobe para 29,8% quando é vista apenas a parcela dos universitários (ou seja, 29,8% dos jovens com 12 anos ou mais de estudo vão pelo menos uma vez por mês ao cinema). Quanto ao consumo de livros, o percentual sobe de 1,7% para 8,1%. No consumo de CDs, vai de 4,4% para 15,1%; no de periódicos, de 7,1% para 28,1%.
Escolaridade também muda total de gastos per capita
Também há diferenças nos gastos per capita mensais considerando todos os jovens (não só os que consomem cultura): se cada jovem gasta, em média, R$12,4 com vídeos, cada jovem universitário gasta R$50,7. Esse valor vai de R$2,7 para R$19,3 no caso dos livros; de R$11,7 para R$67,5 no caso do cinema; e de R$11,5 para R$32,5 quanto ao consumo de teatro.
É entre os consumidores de livros que está Frederico Cavadas Ferreira, de 20 anos:
— Este ano já li nove livros. Estudo produção musical e trabalho com isso, então também compro muito CD e vou a shows toda semana — diz Ferreira. Ele vai menos a peças de teatro do que gostaria: sua última peça foi “Surto”, vista há pouco mais de um mês. — Moro ao lado do Shopping da Gávea, então sempre passo aqui e vejo quais peças estão em cartaz. Mas nem sempre dá para ir. Teatro é muito caro, né?
Para o pesquisador Frederico Barbosa, da diretoria de estudos sociais do Ipea, o resultado do estudo mostra a dificuldade das políticas públicas de oferecerem acesso à cultura.
— A classe mais baixa praticamente não vai ao cinema. Não só pelo preço alto do ingresso, mas porque os cinemas se deslocaram para os shoppings ou para locais que exigem certo tipo de roupa, de comportamento, que faz as pessoas de classe baixa se sentirem excluídas. Com o teatro a situação se agrava, e podemos ver isso no fato de o gasto com ele ser o mais alto, apesar de a ida ao teatro ser bem pouco freqüente. Isso pode ser tanto pelo ingresso caro quanto pela localização das salas, em maior número nas áreas de alta renda — afirma Frederico Barbosa. — Também tem que se levar em conta que esses hábitos se reproduzem de geração em geração. Filhos de pais que não freqüentam cinema, teatro, ou que não lêem, por exemplo, tendem a seguir esses mesmos padrões de consumo cultural. Geralmente as políticas não ampliam o rol dos que consomem cultura. Apenas fazem com que as mesmas pessoas passem a consumir mais.
Cinema
Consumido por 6,3% do total de jovens e por 29,8% dos universitários; gasto per capita total de R$11,7 e de R$67,5 entre universitários
Vídeo
Consumido por 6,5% do total de jovens e por 20,6% dos universitários; gasto per capita total de R$12,4 e de R$50,7 entre os universitários
Teatro
Consumido por 2,8% do total de jovens e por 7,1% dos universitários; gasto per capita total de R$11,5 e de R$32,5 entre os universitários
CD, Vinil e Fita
Consumido por 4,4% do total de jovens e 15,1% dos universitários; gasto per capita total de R$10,6 e de R$46,6 entre os universitários
Livros Didáticos
Consumido por 4,2% do total de jovens e por 3% dos universitários; gasto per capita total de R$3,9 e de R$4 entre os universitários
Livros
Consumido por 1,7% do total de jovens e por 8,1% dos universitários; gasto per capita total de R$2,7 e de R$19,3 entre os universitários
Periódicos
Consumido por 7,1% do total de jovens e por 28,1% dos universitários; gasto per capita total de R$16,6 e de R$86,1 entre os universitários
Outras saídas (boates, bailes, festas, etc.)
Consumido por 8,4% do total de jovens e por 18,6% dos universitários; gasto per capita total de R$33,5 e de R$126,4 entre os universitários
“Geralmente as políticas não ampliam
o rol dos que consomem cultura.
Apenas fazem com que as mesmas
pessoas passem a consumir mais.”
Frederico Barbosa, pesquisador do Ipea
O que vocês acham, midiáticos!? Dêem suas opiniões!
‘O último filme que vi no cinema foi ‘X-Men 2’, conta Flávio Anastácio da Costa, de 20 anos.
Será que não foi o 3, de 2006, o longa mais recente da série, em vez do 2, lançado há cinco anos?
— Não, foi o 2 mesmo.
Morador da Cidade de Deus, favela na Zona Oeste do Rio, Flávio Anastácio está acompanhado por 93,7% da população de jovens do país. Essa é a parcela de jovens de 15 a 29 anos no Brasil que não consome cinema, segundo um estudo publicado em abril deste ano pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Chamada “Juventude e políticas sociais no Brasil”, a pesquisa mostra o perfil de consumo de cultura dos jovens brasileiros. A principal conclusão a que se chega com os dados do estudo: levando em conta apenas as atividades e bens culturais pagos, cerca de 90% da juventude brasileira não consomem cultura.
Baseado em dados da última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2003, o estudo aponta que o item mais consumido pelos jovens são os jornais e revistas: 7,1% dos pesquisados compram algum periódico (pelo menos uma vez por mês, a periodicidade que a pesquisa leva em conta para dizer que aquele bem é consumido). Em seguida, vêm os vídeos (onde entram os DVDs), consumidos no mínimo uma vez por mês por 6,5%; cinema, com 6,3%; CDs de música, com 4,4%; e livros didáticos, com 4,2% (aqui entra o fato de que boa parte das famílias recebe livros didáticos gratuitos, pela política do governo federal de popularização desse material).
Entre os menos consumidos, peças e livros
Os menos votados foram teatro, consumido por apenas 2,8% dos jovens, e livros (excluindo os didáticos), com 1,7%. Há ainda o item “Outras saídas”, no qual entram boates, festas, shows e bailes, consumido por 8,4% dos jovens.
Flávio Anastácio, por exemplo, nem lembra a última vez em que foi ao teatro. Mas toda semana vai a alguma apresentação de break no núcleo da Central Única das Favelas (Cufa) na Cidade de Deus, onde mora, ou a alguma lanhouse ou locadora de filmes do local. Como a Sucilla, há 16 anos lá e onde o filme mais alugado, de longe, é... “Cidade de Deus”.
— Quando o DVD saiu, eu tinha dez cópias e as dez ficavam alugadas todo dia — diz Antônia Cardoso, uma das donas da locadora, com cinco mil associados.
Bailes charme e funk — que entram na categoria “Outras saídas” — também estão na lista de compras culturais da juventude da região.
— Aqui são uns três bailes, todo fim de semana. No baile Lar de Prata, a mania agora é ver qual galera é a maior e tem a melhor fantasia: existe a galera do boné, que vai para o baile de boné; o bonde da raquete, que vai com raquete de tênis; a galera do mototáxi, que vai de capacete... Tem uma que foi uma vez de “Hulk”, com todos pintados de verde — conta Gabriel Pessoa Ferreira, de 21 anos, outro morador da Cidade de Deus.
Pesquisa aponta o peso dos caros ingressos de teatro
O estudo do Ipea mostra também o gasto médio mensal dos jovens com cultura. Apesar de ir pouco ao teatro, é com ele o maior gasto per capita mensal dos jovens, entre aqueles consumidores de cultura: R$403. O que indicaria o quanto o preço do ingresso de teatro é alto: nas poucas vezes em que o jovem vai a uma peça, gasta muito, e o suficiente para que esse seja seu maior gasto em cultura.
O segundo maior gasto (excluindo-se a categoria “Outras saídas”, com R$400) é com CDs (R$237), seguido por periódicos (R$235), vídeos (R$190), cinema (R$186), livros (R$157) e livros didáticos (R$94).
A pesquisa revela ainda as desigualdades de acesso à cultura segundo a escolaridade. Quando se vai para a parcela dos jovens com 12 anos ou mais de estudo (os universitários), o percentual de jovens que consomem cultura e o gasto deles com ações e bens culturais se multiplicam por até seis vezes.
Se só 6,3% dos jovens, no total, vão ao cinema, esse número sobe para 29,8% quando é vista apenas a parcela dos universitários (ou seja, 29,8% dos jovens com 12 anos ou mais de estudo vão pelo menos uma vez por mês ao cinema). Quanto ao consumo de livros, o percentual sobe de 1,7% para 8,1%. No consumo de CDs, vai de 4,4% para 15,1%; no de periódicos, de 7,1% para 28,1%.
Escolaridade também muda total de gastos per capita
Também há diferenças nos gastos per capita mensais considerando todos os jovens (não só os que consomem cultura): se cada jovem gasta, em média, R$12,4 com vídeos, cada jovem universitário gasta R$50,7. Esse valor vai de R$2,7 para R$19,3 no caso dos livros; de R$11,7 para R$67,5 no caso do cinema; e de R$11,5 para R$32,5 quanto ao consumo de teatro.
É entre os consumidores de livros que está Frederico Cavadas Ferreira, de 20 anos:
— Este ano já li nove livros. Estudo produção musical e trabalho com isso, então também compro muito CD e vou a shows toda semana — diz Ferreira. Ele vai menos a peças de teatro do que gostaria: sua última peça foi “Surto”, vista há pouco mais de um mês. — Moro ao lado do Shopping da Gávea, então sempre passo aqui e vejo quais peças estão em cartaz. Mas nem sempre dá para ir. Teatro é muito caro, né?
Para o pesquisador Frederico Barbosa, da diretoria de estudos sociais do Ipea, o resultado do estudo mostra a dificuldade das políticas públicas de oferecerem acesso à cultura.
— A classe mais baixa praticamente não vai ao cinema. Não só pelo preço alto do ingresso, mas porque os cinemas se deslocaram para os shoppings ou para locais que exigem certo tipo de roupa, de comportamento, que faz as pessoas de classe baixa se sentirem excluídas. Com o teatro a situação se agrava, e podemos ver isso no fato de o gasto com ele ser o mais alto, apesar de a ida ao teatro ser bem pouco freqüente. Isso pode ser tanto pelo ingresso caro quanto pela localização das salas, em maior número nas áreas de alta renda — afirma Frederico Barbosa. — Também tem que se levar em conta que esses hábitos se reproduzem de geração em geração. Filhos de pais que não freqüentam cinema, teatro, ou que não lêem, por exemplo, tendem a seguir esses mesmos padrões de consumo cultural. Geralmente as políticas não ampliam o rol dos que consomem cultura. Apenas fazem com que as mesmas pessoas passem a consumir mais.
Cinema
Consumido por 6,3% do total de jovens e por 29,8% dos universitários; gasto per capita total de R$11,7 e de R$67,5 entre universitários
Vídeo
Consumido por 6,5% do total de jovens e por 20,6% dos universitários; gasto per capita total de R$12,4 e de R$50,7 entre os universitários
Teatro
Consumido por 2,8% do total de jovens e por 7,1% dos universitários; gasto per capita total de R$11,5 e de R$32,5 entre os universitários
CD, Vinil e Fita
Consumido por 4,4% do total de jovens e 15,1% dos universitários; gasto per capita total de R$10,6 e de R$46,6 entre os universitários
Livros Didáticos
Consumido por 4,2% do total de jovens e por 3% dos universitários; gasto per capita total de R$3,9 e de R$4 entre os universitários
Livros
Consumido por 1,7% do total de jovens e por 8,1% dos universitários; gasto per capita total de R$2,7 e de R$19,3 entre os universitários
Periódicos
Consumido por 7,1% do total de jovens e por 28,1% dos universitários; gasto per capita total de R$16,6 e de R$86,1 entre os universitários
Outras saídas (boates, bailes, festas, etc.)
Consumido por 8,4% do total de jovens e por 18,6% dos universitários; gasto per capita total de R$33,5 e de R$126,4 entre os universitários
“Geralmente as políticas não ampliam
o rol dos que consomem cultura.
Apenas fazem com que as mesmas
pessoas passem a consumir mais.”
Frederico Barbosa, pesquisador do Ipea
O que vocês acham, midiáticos!? Dêem suas opiniões!
domingo, 8 de junho de 2008
"Antonin Artaud, o teatro e a crueldade, 60 anos depois..."
Dica do professor André Queiroz:
Prezados,
Na próxima terça-feira, dia 10 de junho, estaremos reunidos em torno do evento "Antonin Artaud - o teatro e a crueldade sessenta anos depois" na Av. Epitácio Pessoa, 1.664 - Ipanema. Organizado pelo Jorge Vasconcellos, o evento conta com as seguintes atividades:
15h - Mesa I
ARTAUD: ARTE E PENSAMENTO
Com Jorge vasconcellos, Ana Lee e Ana Kiffer.
19h - Leitura Dramatizada.
PARA DAR FIM AO JULGAMENTO DE DEUS
Direção de Juan Posada
Com os alunos dos Cursos de Teatro e Artes Dramáticas.
20h - Mesa II
ARTAUD: VIDA E TEATRO
Com Juan Posada, Thereza Rocha, André Queiroz
Entra 17h30 e 19h teremos performances pela unidade criadas pelos alunos do curso de Artes Dramáticas da Univercidade.
Prezados,
Na próxima terça-feira, dia 10 de junho, estaremos reunidos em torno do evento "Antonin Artaud - o teatro e a crueldade sessenta anos depois" na Av. Epitácio Pessoa, 1.664 - Ipanema. Organizado pelo Jorge Vasconcellos, o evento conta com as seguintes atividades:
15h - Mesa I
ARTAUD: ARTE E PENSAMENTO
Com Jorge vasconcellos, Ana Lee e Ana Kiffer.
19h - Leitura Dramatizada.
PARA DAR FIM AO JULGAMENTO DE DEUS
Direção de Juan Posada
Com os alunos dos Cursos de Teatro e Artes Dramáticas.
20h - Mesa II
ARTAUD: VIDA E TEATRO
Com Juan Posada, Thereza Rocha, André Queiroz
Entra 17h30 e 19h teremos performances pela unidade criadas pelos alunos do curso de Artes Dramáticas da Univercidade.
terça-feira, 3 de junho de 2008
ABL inaugura cineclube com homenagem a Machado de Assis
Eventos - Folha Online - 03/06/2008
O cineasta e imortal Nelson Pereira dos Santos apresenta o projeto cineclube da ABL (Academia Brasileira de Letras), nesta quarta (4), às 18h30. Pelo projeto, a cada quarta serão exibidas produções nacionais no teatro do edifício Petit Trianon, sede da instituição (av. Presidente Wilson, 203, Castelo, Rio; tel. 0/xx/21/3974-2500).
O primeiro ciclo, que vai até o mês de agosto, serão exibidos trabalhos inspirados na obra do escritor Machado de Assis (1839-1908), um dos fundadores da ABL. Nesta quarta, será exibido o filme "Missa do Galo", trabalho inédito do próprio Nelson Pereira dos Santos, inspirado em conto homônimo de Machado de Assis.
Também serão exibidos "Um Apólogo" (1939), de Humberto Mauro, e "O Rio de Machado de Assis" (1965), também de Santos. A entrada é gratuita e os freqüentes ganharão certificado. A mostra é mais uma das homenagens da ABL ao centenário de morte de Machado de Assis, em 29 de setembro deste ano.
O público também poderá conferir outras produções inéditas e pré-estréias, como "O Demoninho de Olhos Pretos" (2007), de Haroldo Marinho Barbosa. Em agosto, a exibição de "Azyllo Muito Louco" (1971) --baseado no conto "O Alienista", de Machado--, outra produção de Nelson, será acompanhada do lançamento em DVD do filme. O projeto tem patrocínio da Petrobras.
Nelson Pereira dos Santos é o nono ocupante da cadeira 7 da ABL. Ele foi eleito em 9 de março de 2006 na sucessão do acadêmico Sergio Corrêa da Costa e recebido pelo Acadêmico Cícero Sandroni --atual presidente da ABL-- em 17 de julho de 2006.
Santos estreou na direção cinematográfica com o filme "Rio 40 Graus" (1955). Filmado nas ruas do Rio e mostrando pessoas reais, o longa foi precursor do Cinema Novo. O filme "Vidas Secas" (1963), adaptação do romance homônimo de Graciliano Ramos, é considerado por muitos como a obra-prima do cineasta. A programação completa está disponível no site da instituição.
O cineasta e imortal Nelson Pereira dos Santos apresenta o projeto cineclube da ABL (Academia Brasileira de Letras), nesta quarta (4), às 18h30. Pelo projeto, a cada quarta serão exibidas produções nacionais no teatro do edifício Petit Trianon, sede da instituição (av. Presidente Wilson, 203, Castelo, Rio; tel. 0/xx/21/3974-2500).
O primeiro ciclo, que vai até o mês de agosto, serão exibidos trabalhos inspirados na obra do escritor Machado de Assis (1839-1908), um dos fundadores da ABL. Nesta quarta, será exibido o filme "Missa do Galo", trabalho inédito do próprio Nelson Pereira dos Santos, inspirado em conto homônimo de Machado de Assis.
Também serão exibidos "Um Apólogo" (1939), de Humberto Mauro, e "O Rio de Machado de Assis" (1965), também de Santos. A entrada é gratuita e os freqüentes ganharão certificado. A mostra é mais uma das homenagens da ABL ao centenário de morte de Machado de Assis, em 29 de setembro deste ano.
O público também poderá conferir outras produções inéditas e pré-estréias, como "O Demoninho de Olhos Pretos" (2007), de Haroldo Marinho Barbosa. Em agosto, a exibição de "Azyllo Muito Louco" (1971) --baseado no conto "O Alienista", de Machado--, outra produção de Nelson, será acompanhada do lançamento em DVD do filme. O projeto tem patrocínio da Petrobras.
Nelson Pereira dos Santos é o nono ocupante da cadeira 7 da ABL. Ele foi eleito em 9 de março de 2006 na sucessão do acadêmico Sergio Corrêa da Costa e recebido pelo Acadêmico Cícero Sandroni --atual presidente da ABL-- em 17 de julho de 2006.
Santos estreou na direção cinematográfica com o filme "Rio 40 Graus" (1955). Filmado nas ruas do Rio e mostrando pessoas reais, o longa foi precursor do Cinema Novo. O filme "Vidas Secas" (1963), adaptação do romance homônimo de Graciliano Ramos, é considerado por muitos como a obra-prima do cineasta. A programação completa está disponível no site da instituição.
Clipestesia
O site do Clipestesia está no ar... Repasso abaixo a mensagem da Ariane sobre a criação da página:
Olá a todos,
é com muito orgulho e prazer que comunico que um dos primeiros sites sobre videoclipe do país acabou de entrar no ar. Trata-se de uma parceria entre mim e nove alunos dos cursos de Estudos Culturais e Midia e Produção Cultural da UFF.
Orkut; YouTube
http://www.clipestesia.com.br
A idéia surgiu há um ano, quando ministrei a disciplina de Linguagem de Videoclipe como estágio de docência do mestrado, mas estamos trabalhando duro há três meses para colocar o projeto no ar. Além de artigos feitos pelos próprios alunos, temos quatro blogs e um hotsite atualizados diariamente, além de um canal no Youtube que já conta com mais de 350 clipes postados por nós.
Como não temos no Brasil uma cultura de postagem de vídeos solidificada, o nosso canal já é um dos 100 maiores do país! Ainda temos games, enquetes, matérias, vídeos... Tudo que vocés virem no site, inclusive o layout e a linguagem de html, foi idealizado e elaborado pelos alunos.
Estamos desenvolvendo agora uma estratégia de divulgação para firmar parcerias empresariais com gravadoras, fãs clubes etc.
Se puderem, a visita de todos será mais que bem-vinda!
Abraços, Ariane Holzbach
Olá a todos,
é com muito orgulho e prazer que comunico que um dos primeiros sites sobre videoclipe do país acabou de entrar no ar. Trata-se de uma parceria entre mim e nove alunos dos cursos de Estudos Culturais e Midia e Produção Cultural da UFF.
Orkut; YouTube
http://www.clipestesia.com.br
A idéia surgiu há um ano, quando ministrei a disciplina de Linguagem de Videoclipe como estágio de docência do mestrado, mas estamos trabalhando duro há três meses para colocar o projeto no ar. Além de artigos feitos pelos próprios alunos, temos quatro blogs e um hotsite atualizados diariamente, além de um canal no Youtube que já conta com mais de 350 clipes postados por nós.
Como não temos no Brasil uma cultura de postagem de vídeos solidificada, o nosso canal já é um dos 100 maiores do país! Ainda temos games, enquetes, matérias, vídeos... Tudo que vocés virem no site, inclusive o layout e a linguagem de html, foi idealizado e elaborado pelos alunos.
Estamos desenvolvendo agora uma estratégia de divulgação para firmar parcerias empresariais com gravadoras, fãs clubes etc.
Se puderem, a visita de todos será mais que bem-vinda!
Abraços, Ariane Holzbach
Destrinchando as Novelas
Evento - Simone Mousse - Jornal O Globo - 01/06/2008
Sílvio de Abreu: o autor será o primeiro convidado do ciclo
Uma novela reflete a realidade ou a modifica, criando modismos? Por que tanta gente tem vergonha de admitir que acompanha capítulo por capítulo? Estas são algumas questões que serão discutidas no “Eu vejo novela”, ciclo de debates aberto ao público que começará dia 04 de Junho, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) às 18h30m. Idealizado pelas jornalistas Cristiane Costa e Valéria Lamego, o projeto terá a participação de autores experientes, como Sílvio de Abreu, Manoel Carlos, Gilberto Braga e Lauro César Muniz , e de pesquisadores do assunto, como Heloísa Buarque de Hollanda, Esther Hamburger e Mirian Goldenberg.
— Até há pouco tempo, muitos intelectuais tinham vergonha de confessar: “Eu vejo novela”. Mas atire a primeira pedra quem não acompanhou o assassinato de Odete Roitman em “Vale tudo” ou torceu por Bebel e Olavo em “Paraíso tropical” — diz Cristiane, autora do livro “Eu compro essa mulher: Romance e consumo nas telenovelas brasileiras e mexicanas”.
A idéia surgiu quando ela e Valéria, noveleiras inveteradas, resolveram oferecer aos fãs do gênero algo que não se vê por aí: oportunidade para debatê-lo. Resolveram, então, botar estudiosos e autores cara a cara.
— As novelas são o principal referencial de literatura de ficção para grande parte dos brasileiros, e muitas vezes o único. Mas a reflexão sobre sua estrutura narrativa, suas mensagens subliminares e seu impacto no imaginário ainda é pequena. Assim como o contato entre autores, estudiosos e o público — comenta Valéria. — Para os intelectuais, ver novela é fundamental como mecanismo para aprender o social. Ao lado da música e do futebol, ela é o tripé do brasileiro.
Sílvio de Abreu: o autor será o primeiro convidado do ciclo
Uma novela reflete a realidade ou a modifica, criando modismos? Por que tanta gente tem vergonha de admitir que acompanha capítulo por capítulo? Estas são algumas questões que serão discutidas no “Eu vejo novela”, ciclo de debates aberto ao público que começará dia 04 de Junho, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) às 18h30m. Idealizado pelas jornalistas Cristiane Costa e Valéria Lamego, o projeto terá a participação de autores experientes, como Sílvio de Abreu, Manoel Carlos, Gilberto Braga e Lauro César Muniz , e de pesquisadores do assunto, como Heloísa Buarque de Hollanda, Esther Hamburger e Mirian Goldenberg.
— Até há pouco tempo, muitos intelectuais tinham vergonha de confessar: “Eu vejo novela”. Mas atire a primeira pedra quem não acompanhou o assassinato de Odete Roitman em “Vale tudo” ou torceu por Bebel e Olavo em “Paraíso tropical” — diz Cristiane, autora do livro “Eu compro essa mulher: Romance e consumo nas telenovelas brasileiras e mexicanas”.
A idéia surgiu quando ela e Valéria, noveleiras inveteradas, resolveram oferecer aos fãs do gênero algo que não se vê por aí: oportunidade para debatê-lo. Resolveram, então, botar estudiosos e autores cara a cara.
— As novelas são o principal referencial de literatura de ficção para grande parte dos brasileiros, e muitas vezes o único. Mas a reflexão sobre sua estrutura narrativa, suas mensagens subliminares e seu impacto no imaginário ainda é pequena. Assim como o contato entre autores, estudiosos e o público — comenta Valéria. — Para os intelectuais, ver novela é fundamental como mecanismo para aprender o social. Ao lado da música e do futebol, ela é o tripé do brasileiro.
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