sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Entrevista com o cineasta Sílvio Tendler

'O filme é quase um panfleto'

O cineasta Sílvio Tendler voltou suas lentes para o futuro e esmiúça, pelo olhar do geógrafo Milton Santos, o processo de construção da humanidade. "Encontro com Milton Santos ou a globalização vista do lado de cá" traz o último depoimento de Santos, que morreu em 2001.


Após contar as vidas de JK, Jango, Castro Alves e Glauber Rocha, por que um filme sobre um acadêmico?

SÍLVIO TENDLER: Queria um outro ponto de vista, alternativo, sobre a globalização. Desde os anos 90, acompanho a questão, e percebi que havia mais ruído do que informação. Fui então ouvir o professor Milton Santos, que era um arauto contra essa globalização que está aí.

Em que sentido ele é contra a globalização?

TENDLER: Ele não é contra a globalização. Ele não é a favor de um processo retrógrado. É a favor de um avanço, mas é crítico do processo que está aí. Esse tipo de globalização. Segundo ele, nunca houve tantas condições tecnológicas para a humanidade se desenvolver, mas as condições foram expropriadas por um grupo de empresas. Então, eu fui buscar exemplos.

A que você atribui o sucesso do filme?

TENDLER: Funcionou porque é crítico. Um filme que, não tenho vergonha de dizer, é quase um panfleto sobre a globalização, que ele chama de globalitarismo: globalização com autoritarismo.

Como o tema é abordado?

TENDLER: Estou feliz de ter feito esse filme, porque a gente discute as questões fundamentais não para o passado, mas para o futuro. Por exemplo, a questão da água, que será o problema dos próximos 20 anos. Há dois processos de globalização: um deles é a água sendo explorada como um bem comum à humanidade; e o outro é a água como valor de mercado, explorada na bolsa de valores no futuro, como o petróleo.

Como é o filme?

TENDLER: O Milton Santos aborda essas questões, e eu dialogo com ele no filme, colocando exemplos. Ele fala dos movimentos sociais, diz que quem vai poder transformar a humanidade são os de baixo. E levanta questões polêmicas, mas necessárias. Ele não cria facilidades, cria dificuldades. E, complementando, entrevistei outros intelectuais. Tem o (José) Saramago, o Eduardo Galeano, o Aílton Krenak (líder indígena) e cineastas alternativos. Há uma diversidade cultural rica, e acho que o filme vai levantar uma poeira necessária.

Quais as dificuldades e expectativas sobre o filme?

TENDLER: Não gosto de falar sobre as dificuldades, porque acho que elas fazem parte de qualquer processo criativo. Prefiro falar do desejo de que esse filme comunique. Estou promovendo a distribuição porque hoje é muito complicado montar uma distribuição alternativa, independente. Eu toco num tema que é candente. Não é um filme balizado pela indústria do entretenimento, é um filme para discussão de idéias.

Como você vê o professor Milton Santos?

TENDLER: Ele tem um pensamento particular. Na abertura do filme, diz: “Não estou preso a nenhum grupo político, não pertenço a nenhum partido, sequer a um grupo de intelectuais. Não tenho nenhuma doutrina, nenhuma fé, nenhuma religião. Sou um homem independente. Um outsider.” Eu acho isso fundamental.

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